Blog
09 de fevereiro de 2022
Burnout como sintoma organizacional
Finalizamos o mês de janeiro, conhecido como o mês onde é fomentado o tema Saúde Mental com a campanha Janeiro Branco. Não por isso, ficamos restritos a essa temática apenas em janeiro.
Falar sobre saúde mental é pertinente a qualquer momento, em qualquer tempo, e por isso o mês escolhido para essa campanha é justamente janeiro — o primeiro mês do ano, momento em que simbolicamente refletimos sobre nossas vidas e traçamos novos planos. A ideia é criar uma cultura de saúde mental, para que esta seja prioridade em sua vida para o ano todo.
Outro tema muito comentado em janeiro de 2022, relacionado a Saúde Mental, foi o reconhecimento no CID-11 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) da Síndrome de Burnout como fenômeno ocupacional.
O que isso significa?
Significa que se você desenvolve um quadro diagnóstico de Burnout ele é consequência do seu trabalho, ou seja, você passa a ter direitos que antes não eram reconhecidos, como:
Licença médica remunerada pelo trabalhador por um período de até 15 dias;
Afastamento superior a 15 dias passa a ter direito ao benefício previdenciário auxílio-doença cedido pelo INSS;
Estabilidade provisória após o fim do auxílio-doença de 12 meses.
Por que o Burnout recebeu esse reconhecimento de doença ocupacional e outros transtornos não?
A resposta é que o Burnout se manifesta exclusivamente na relação com o trabalho. É um sintoma organizacional! Se você desenvolveu um quadro de Burnout, não é porque você tem algum fator genético ou subjetivo que o leva a ter a doença, mas sim, porque o seu ambiente de trabalho, de alguma forma é adoecedor e isso pode se dar de diversas maneiras, que explico adiante.
Primeiramente é importante deixar claro que o Burnout não aparece do nada, começa com um quadro de estresse, que se não tiver a devida atenção evolui para um quadro crônico. Se não houver mudanças na relação com o trabalho, esse quadro evolui para o Burnout.
Para identificar a presença da doença, é preciso observar 3 sinais significativos:
Exaustão física e mental: não há mais forças para fazer qualquer atividade após o trabalho, cansaço físico exacerbado para ações que antes eram simples, perda da libido, dificuldades na concentração e em manter o foco nas atividades.
Baixa produtividade: perda da motivação e engajamento, não há mais sentido no trabalho e nas tarefas que realiza, passa a cometer mais erros por ter dificuldade em se concentrar ou manter-se focado, precisando se esforçar ainda mais para fazer suas entregas.
Despersonalização: deixar de ser você mesmo, ter dificuldade de se relacionar com as pessoas. Alteração no humor, passando a usar o cinismo com frequência, além de fazer comentários constantes relacionados ao trabalho ser algo negativo em sua vida.
Quais as causas do Burnout?
Como é uma doença ocupacional, entendesse que a causa está relacionada com o seu trabalho. Dentro de uma empresa ou em uma profissão há vários fatores que podem ser fonte de estresse, como:
Cultura organizacional: um empresa que tenha uma cultura hostil, corrupta;
Condições de trabalho: ambiente insalubre, falta de ferramentas adequadas para trabalhar ou equipamentos de segurança, móveis que não sejam ergonômicos, excesso de ruído;
Gestão de pessoas: falta de feedback e direcionamento, comunicação falha e com ruídos, excesso de cobrança, desvalorização, salário incompatível com a função
Processos de trabalho: não ter clareza sobre suas responsabilidades, falta de um fluxo de trabalho que seja prático e faça sentido, definição de metas que são impossíveis de atingir, excesso de trabalho e horas dedicadas a ele.
Esses são apenas alguns exemplos, mas podem haver diversos fatores e nunca é algo isolado. A combinação dos fatores e a frequência de exposição a eles, pode levar ao estresse e em consequência progredir para o Burnout. Importante ressaltar que, um caso diagnosticado é sinal de alerta, pois mais pessoas na organização podem estar com sintomas e sofrendo por isso.
Diante dessas informações, quero compartilhar uma prática que temos aqui na Before que nos ajuda a agir de forma preventiva em relação ao estresse. Temos um programa de saúde mental chamado Gerenciamente que visa mapear os riscos psicossociais relacionados ao trabalho, ou seja, buscamos sempre identificar aqui na empresa o que pode haver em nossa gestão, na conduta das lideranças, nos processos e nas relações das pessoas que podem favorecer o surgimento do estresse. E como fazemos isso?
Vou compartilhar algumas das nossas ações, para quem sabe outras empresas se inspiram também na busca de um ambiente mais saudável:
Promoção da segurança psicológica: através do diálogo e práticas como reuniões 1:1, avaliação de desempenho, criação de planos de desenvolvimento individual, plano de carreira, benefícios, dayoff, horário flexível… conseguimos garantir que nossos colaboradores se sintam acolhidos, ouvidos e respeitados aqui, eles sabem que podem contar com a gente!
Diagnóstico organizacional: constantemente realizamos pesquisas para monitorar nível de estresse e qualidade de vida, satisfação e relação de prazer e sofrimento com o trabalho. Coletamos feedbacks das nossas ações e da gestão para identificarmos os gaps e oportunidades para melhorias, desenvolvendo plano de ação que podem ocorrer em nível individual, por time ou para a empresa toda;
Capacitação da liderança: temos o acompanhamento semanal na formação de novos líderes, além de sempre conscientizá-los sobre temáticas relacionadas à saúde mental, motivação, feedback. Como resultado, temos uma liderança sensibilizada em relação aos fatores de adoecimento, que facilmente conseguem identificar quando um colaborador precisa de alguma ajuda;
Chat do bem: canal de comunicação seguro para sugestões, críticas, denúncias, para as pessoas falarem o que as incomoda;
Ações relacionadas à saúde mental: conscientização sobre o tema através de palestras e bate-papo com profissionais da área para todos os nossos colaboradores;
Em resumo, quando o assunto é Burnout, a empresa precisa se posicionar e ter ações que promovam um ambiente onde o trabalho seja uma fonte de saúde e sentido para a vida, e não de adoecimento.
Caso identifique algum sinal de estresse, converse com o seu gestor e/ou o RH para entender o que possa estar favorecendo o surgimento de algum sintoma e cobre da empresa ações para mudar o cenário. Você também pode e deve buscar ajuda profissional de um psicólogo, a psicoterapia sempre nos auxilia a entender como lidamos com o mundo, do porque nos permitimos vivenciar certas situações e ambientes. Dependendo do nível do Burnout, é preciso intervenção medicamentosa prescrita por um psiquiatra, porque em alguns casos pode evoluir para depressão, até mesmo tentativa de suicídio.
Há também uma discussão sobre o workaholism e sua relação com o Burnout. A pessoa workaholic é viciada em trabalho, o mesmo lhe dá um prazer que geralmente outras atividades não substituem, são pessoas altamente engajadas, que trabalham até tarde e fissuradas por atingir resultados, e muitas vezes negligenciam a própria saúde e seus relacionamentos. Esse perfil tende a desenvolver o Burnout, mesmo a pessoa se sentindo realizada com o trabalho, porque a exaustão sempre chega. Mesmo havendo essa tendência individual à adicção ao trabalho, muitas empresas romantizam e normalizam comportamentos assim, reforçando ainda mais as pessoas a desenvolverem o workaholism. Sempre reflita sobre sua relação com o trabalho e qual papel ele ocupa em sua vida!
Acima de tudo, como o Burnout é um sintoma organizacional, você pode buscar tratamento para amenizar os sintomas, tirar umas férias, viajar, mas quando retornar, se o fator estressor não for resolvido, nada vai adiantar, você pode pedir demissão, mas outras pessoas irão adoecer nesse ambiente.
Na Before nos preocupamos em ter ações voltadas a entender os fatores de risco e não somente auxílio terapia e sensibilização sobre o tema, porque a empresa que não olha para suas práticas não consegue transformá-las e provocar as mudanças necessárias para um clima organizacional que promova saúde mental
Fique ligado nisso, a saúde mental precisa ser prioridade!
Texto: Damares Costa (Psicóloga, especialista em Psicologia do Trabalho)